Trump ameaça tarifar Brasil em 50% e mira liderança de Lula no Sul Global
Foto: Reprodução
Por Silas Avila Jr. – Correspondente Internacional
Nova Iorque – Em um dos episódios mais graves nas relações diplomáticas entre Brasil e Estados Unidos nas últimas décadas, o presidente americano Donald Trump anunciou a imposição de tarifas de 50% sobre todos os produtos brasileiros exportados aos EUA, a partir de 1º de agosto. A decisão, formalizada por meio de uma carta oficial enviada ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva, rompe com padrões tradicionais da diplomacia americana e expõe uma estratégia de contenção à ascensão geopolítica do Brasil no cenário internacional.
A carta foi enviada apenas dois dias após o encerramento da 17ª Cúpula do BRICS no Rio de Janeiro, a primeira sob presidência brasileira desde a ampliação do bloco. O encontro reuniu 21 países e consolidou a posição do grupo como força alternativa à ordem internacional liderada pelos EUA, com propostas concretas de desdolarização, reforma da governança global e criação de novos instrumentos financeiros.
Poucos dias antes, em 3 de julho, o Brasil assumiu também a presidência pro tempore do Mercosul, com uma agenda ambiciosa voltada à integração regional, acordos comerciais com a União Europeia e a EFTA, e fortalecimento da Tarifa Externa Comum.
O timing da carta de Trump, somado ao tom hostil e às justificativas inconsistentes, revela o que especialistas têm classificado como uma reação estratégica à nova postura ativa do Brasil na diplomacia internacional. Diferentemente de comunicações similares enviadas a outros países, a carta ao Brasil adota um tom abertamente político, iniciando com uma defesa enfática do ex-presidente Jair Bolsonaro e críticas diretas ao Supremo Tribunal Federal. Trump chega a classificar o julgamento de Bolsonaro como uma “caça às bruxas” e uma “vergonha internacional”, exigindo seu encerramento imediato, em uma clara violação ao princípio da não interferência nos assuntos internos de outro país.
As justificativas econômicas também carecem de respaldo nos dados. Trump alega que o Brasil impõe tarifas e barreiras comerciais que causam “déficits comerciais insustentáveis” para os Estados Unidos. No entanto, dados do Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior mostram o contrário: entre 1997 e 2025, os EUA acumularam um superávit de US$ 49,88 bilhões no comércio com o Brasil. Desde 2009, o Brasil registra déficits consecutivos na balança comercial com os americanos. A Câmara Americana de Comércio para o Brasil (Amcham) reforçou esses dados, expressando “profunda preocupação” com a medida e alertando para impactos negativos em empresas americanas que operam no país.
A carta inclui ainda ameaças de retaliação em caso de reação brasileira e anuncia a abertura de uma investigação baseada na Seção 301 da legislação comercial dos EUA, a mesma usada como base para a guerra comercial com a China. A iniciativa pode resultar em novas sanções unilaterais e é vista como um instrumento de pressão contínua sobre o governo brasileiro.
Impactos econômicos e riscos à soberania
O setor produtivo brasileiro já projeta impactos severos. Segundo estimativa do banco JPMorgan, as tarifas podem causar uma redução de até 1,2% no PIB, com forte impacto em setores estratégicos como siderurgia, mineração, papel e celulose, café e suco de laranja. Minas Gerais, por exemplo, maior polo siderúrgico do país, deve ser duramente atingida. O agronegócio também teme prejuízos significativos, especialmente em produtos de alto valor agregado como carne bovina e derivados de soja.
Além dos efeitos diretos sobre as exportações, economistas alertam para pressões inflacionárias e volatilidade cambial, com possível desvalorização do real e aumento dos custos de produção. A Confederação Nacional da Indústria (CNI) considerou as tarifas “injustificadas” do ponto de vista econômico e “claramente políticas”, e advertiu para os riscos de desestabilização no comércio bilateral.
O pano de fundo geopolítico: BRICS e Mercosul sob liderança brasileira
Para analistas de relações internacionais, as tarifas representam mais do que um gesto protecionista: são parte de uma ofensiva geopolítica. Ao assumir protagonismo nos debates sobre desdolarização, reforma do sistema financeiro internacional e novos padrões de governança global, o Brasil vem se posicionando como liderança natural do Sul Global, uma postura que confronta diretamente os interesses estratégicos dos Estados Unidos.
O BRICS, sob presidência brasileira, aprovou em julho um conjunto de iniciativas com potencial de remodelar o equilíbrio de poder global, incluindo o fortalecimento do Arranjo Contingente de Reservas, a criação de canais de pagamento alternativos ao sistema SWIFT, e a ampliação do bloco com novos membros como Indonésia, Vietnã, Nigéria e Malásia. A agenda também prevê o uso de moedas locais no comércio bilateral e maior autonomia frente ao dólar americano.
No Mercosul, Lula defende uma integração mais profunda e politicamente coesa. A retomada dos acordos com a União Europeia e com a EFTA, além do fortalecimento da Tarifa Externa Comum, representa um reposicionamento estratégico da América do Sul diante da competição entre grandes potências. Trump enxerga essa reorientação como ameaça à influência tradicional dos EUA na região, e responde com coerção econômica.
Resposta brasileira: desafio e oportunidade
Apesar dos impactos imediatos, a ofensiva americana pode ter o efeito oposto ao desejado. Ao usar tarifas como instrumento político, Trump fortalece o argumento de que é preciso reduzir a dependência de países em desenvolvimento em relação às potências ocidentais. A resposta brasileira, articulada com seus parceiros no BRICS e no Mercosul, pode acelerar a busca por novos mercados, estímulo à produção interna e fortalecimento de cadeias regionais de valor.
Lula já sinalizou que buscará diálogo diplomático, mas sem abrir mão da soberania nacional ou da agenda internacional brasileira. O Itamaraty trabalha em coordenação com os Ministérios da Fazenda e da Indústria para definir contramedidas proporcionais, dentro dos mecanismos permitidos pela OMC e pela Lei de Retaliação Econômica aprovada no Congresso em 2024.
A carta de Trump não é apenas uma medida comercial, é um sinal claro de que o Brasil, ao assumir papel protagonista no mundo multipolar que emerge, passa a ser visto como ator relevante e um incômodo por potências tradicionais. O episódio pode marcar um divisor de águas na diplomacia brasileira, com repercussões duradouras para o comércio exterior, os investimentos e o papel do país na nova ordem internacional.
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arthur
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