IBGE: metade das cidades brasileiras não tem estrutura de combate à fome

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Foto: Tânia Rêgo/Agência Brasil

País – Quase metade dos municípios brasileiros ainda não possui estrutura formal para políticas de segurança alimentar e nutricional. Segundo a Pesquisa de Informações Básicas Estaduais e Municipais (Munic), divulgada nesta sexta-feira (7) pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), 49% das prefeituras do país não têm órgão específico voltado para o combate à fome.

A ausência dessas estruturas reflete também na falta de espaços de participação social. Apenas 51% das cidades declararam ter conselhos municipais de segurança alimentar e nutricional — instâncias que reúnem representantes do poder público e da sociedade civil para discutir e definir diretrizes na área.

Mesmo assim, o cenário atual é mais positivo do que há alguns anos. Em 2018, apenas 36,6% das prefeituras tinham órgãos voltados à segurança alimentar; em 2023, o índice era de 50,3%. Para a gerente da pesquisa, Vania Maria Pacheco, os dados apontam um “bom caminho” no enfrentamento à fome.

“Mesmo com números modestos, é um bom indicativo da presença da política nos municípios, da importância dessa política para esses municípios”, avalia a pesquisadora.

Estrutura concentrada em cidades maiores

Dos 5.544 municípios que responderam ao levantamento, 2.826 afirmaram ter estruturas dedicadas à área, como secretarias exclusivas ou vinculadas a outras pastas. O estudo mostra que a existência desses órgãos está diretamente ligada ao porte populacional: entre as cidades com até 5 mil habitantes, 39,6% contam com instâncias de segurança alimentar, enquanto entre as com mais de 500 mil moradores o índice chega a 91,7%.

No nível estadual, todas as 26 unidades da federação que prestaram informações ao IBGE declararam possuir instituições voltadas ao tema. Rondônia foi a única exceção, por não ter enviado dados.

Conselhos nem sempre funcionam

O IBGE também identificou que, embora mais da metade dos municípios tenha conselhos de segurança alimentar, muitos estão inativos. Dos 2.851 que declararam ter o órgão em 2024, apenas 1.826 realizavam reuniões regulares.

“O conselho tem que existir, mas tem que estar ativo, ou seja, realizando reuniões, sendo ativo na política”, frisa Vania Pacheco.

Nos estados, todos apresentaram conselhos de combate à fome com participação da sociedade civil.

Leis e planos municipais ainda são minoria

Apenas 36,3% dos municípios têm leis próprias sobre segurança alimentar — número que, apesar de baixo, representa crescimento em relação a 2018, quando apenas 20,9% tinham legislação específica. Já os planos municipais de combate à fome são raríssimos: apenas 394 cidades (7,1%) possuem esse tipo de instrumento.

Em 2023, o IBGE havia divulgado que 18,8% das prefeituras tinham planos do tipo, mas, segundo a pesquisadora, parte das informações estava incorreta.

“A informação foi prestada equivocadamente. Esse plano não existia [em 2023] ou ele ainda estava em planejamento, em elaboração”, explica Vania.

Ações práticas e equipamentos públicos

Mesmo com limitações estruturais, a maioria das prefeituras desenvolve ações práticas de combate à fome. O levantamento mostra que 71,9% dos municípios realizam iniciativas de promoção do acesso a alimentos, principalmente por meio da distribuição de cestas básicas (94,6%).

Outras formas de apoio incluem o fornecimento de refeições prontas (22,7%), benefícios monetários (10%), vales-alimentação (6,2%) e diferentes modalidades de assistência (14,5%).

Além disso, 78,7% dos municípios utilizam o Benefício Eventual da Assistência Social, voltado a pessoas em situação de insegurança alimentar.

Agricultura familiar e restaurantes populares

A pesquisa também destaca o papel da agricultura familiar na segurança alimentar. Das 26 unidades da federação que enviaram dados, 24 relataram comprar alimentos produzidos por agricultores familiares. Entre os municípios, mais da metade (54,9%) adota essa prática.

A maior parte desses produtos (81,1%) é destinada a redes socioassistenciais, como cozinhas comunitárias, hospitais e bancos de alimentos.

Já os restaurantes populares estão presentes em apenas 3,8% das cidades brasileiras — 212 municípios ao todo, com 329 unidades em funcionamento. Nesses locais, as refeições são gratuitas ou custam no máximo R$ 10. Entre as cidades com mais de 500 mil habitantes, 66,7% possuem o equipamento.

Os bancos de alimentos, que recebem e redistribuem doações de alimentos, foram encontrados em 226 municípios (4,1%). Cerca de 70% deles funcionam cinco dias por semana.

“É uma esperança minha que esses equipamentos se tornem cada vez mais presentes, em um número maior de municípios, e forneçam alimentação segura e saudável para esse quantitativo de pessoas que, muitas vezes, são pessoas em vulnerabilidade”, afirma Vania Pacheco.

Brasil fora do Mapa da Fome

Em julho, um relatório da Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (FAO) confirmou que o Brasil deixou o Mapa da Fome. O país voltou a registrar menos de 2,5% da população em risco de subnutrição — índice considerado fora da zona crítica.

O Brasil havia saído do Mapa em 2014, mas retornou entre 2018 e 2020. Agora, segundo os dados do IBGE e da FAO, o país volta a mostrar avanços estruturais e sociais na luta contra a fome, embora ainda com grandes desigualdades regionais e de porte municipal. Com informações do Brasil 61.

Agatha Amorim

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